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Indicadores Ambientais

 

 

 

 

 

 

Neste capítulo iremos abordar a questão dos indicadores ambientais, que estão intimamente ligados ao conceito-chave em ambiente: o conceito de sustentabilidade ambiental.

 

Se o Homem vive na Terra há cerca de 300.000 anos, as preocupações ambientais datam tão só da década de 70. Na sequência de vários acidentes industriais de grandes dimensões (Minamata Bay, no Japão em 1960, Niagara Falls nos E.U.A. em 1978, Bhopal na Índia em 1984), começaram-se a ouvir vozes de alerta. O livro “Silent Spring” de Rachel Carson tornou-se emblemático. Eventualmente a questão ambiental tomou proporções políticas, que culminaram com o nascimento do World Business Council for Sustainable Development. Em 1992, foi feita a primeira reunião de líderes mundiais para abordar o domínio do ambiente: a Cimeira da Terra, no Rio de Janeiro. Desde então estabeleceu-se que de 10 em 10 anos os líderes mundiais marcarão encontro numa nova cimeira. A 2ª já aconteceu, foi a Cimeira do Desenvolvimento Sustentável que teve lugar na África do Sul em 2002.

 

Este conceito de desenvolvimento sustentável ou sustentado é um conceito-chave em ambiente. Na sua essência, tenta conciliar o compromisso ambiental com as necessidades de desenvolvimento económico das sociedades. No Tratado da União Europeira pode ler-se no Art.º 2º como primeiro objectivo da União: “a promoção do progresso económico e social e de um elevado nível de emprego e a realização de um desenvolvimento equilibrado e sustentável (...)."

 

Os indicadores de desenvolvimento sustentável são, presentemente, não apenas necessários, mas indispensáveis para fundamentar as tomadas de decisão aos mais diversos níveis e nas mais diversas áreas. Praticamente todos os estados-membros da UE já publicaram documentos sobre indicadores, ambientais ou de desenvolvimento sustentável.

 

Os indicadores e índices podem servir um conjunto de aplicações diferentes:

 

*  atribuição de recursos;

*  classificação de locais;

*  cumprimento de normas legais;

*  análise de tendências;

*  informação ao público;

*  investigação científica.

 

A OCDE apresenta quatro grandes grupos de aplicações de indicadores:

 

*  avaliação do funcionamento dos sistemas ambientais;

*  integração das preocupações ambientais nas políticas sectoriais;

*  contabilidade ambiental;

*  avaliação do estado do ambiente.

 

Fig 3.1 – Pirâmide de Informação e Associação ao tipo de Utilizador [3.1]

 

A título ilustrativo, iremos agora apresentar os dois indicadores mais utilizados globalmente: a pegada ecológica e o índice de sustentabilidade ambiental. Iremos também referir brevemente um dos primeiros indicadores de desenvolvimento sustentável para empresas: o Dow Jones Sustainability Index.

 

 

3.1 – Pegada Ecológica

 

 

Fig. 3.2 - Livro que lançou o conceito.

Desenvolvida pela equipa de Mathis Wackernagel e William Rees [3.2] da University of British Columbia em meados dos anos 90, esta ferramenta contabiliza os recursos ecológicos: o impacte da actividade humana no ambiente. Em concreto, procura traduzir diversas categorias de consumo humano na área de terra produtiva e mar necessários para providenciar recursos e assimilar resíduos (no caso da categoria energia, é a área necessária para absorver o CO2 emitido). Deste modo, oferece uma medida de quão sustentável o nosso estilo de vida é. A área da pegada ecológica pode ser calculada para um país, região, comunidade, ou outro compartimento. (A título de exemplo, é possível calcular a área da pegada de um núcleo familiar na internet [3.3])

 

Com excepção da energia solar, que usamos directamente, todo o outro consumo da população humana provém de recursos terrestres. O valor da pegada é calculado com base nas escolhas feitas no que diz respeito a transportes, alojamento, alimentação, energia, água, entre outros. O seu valor é um espelho do estilo de vida: a área da pegada de uma comunidade onde se usa o carro como veículo de transporte é calculada com base na área necessária para absorver o CO2 produzido. Já se o meio de transporte usado for a bicicleta, será a área que produza a comida necessária para alimentar os ciclistas.

 

A pegada é um rectângulo. A base é proporcional ao número de habitantes, e a altura é o consumo de recursos per capita. Multiplicando base por altura, temos o consumo de recursos dessa população. Em 1999, a área produtiva disponível per capita era 1,9 hectares e a área per capita capaz de dar os recursos consumidos nesse ano era 2.3 hectares. Isto corresponde a um sobredimensionamento: precisaríamos de 120% de área terrestre para acarretar o nosso estilo de vida, ou seja, a humanidade está a usar 120% da capacidade da terra.

 

Fig 3.3 – Valores de 1999 para a pegada ecológica [3.4]

 

A pegada ecológica é uma medida interessante, mas a analisar com cuidado. De acordo com o relatório das Nações Unidas “State of World Population 2001“[3.5] o continente africano regista valores de pegada ecológica bastante bons (ou seja, estas regiões possuem mais área do que a necessária para suportar o estilo de vida dos seus habitantes), mas este facto está contudo ligado a situações de pobreza generalizada. Já na Europa, o panorama genérico é um défice de área. Quer isto dizer que o estilo de vida dos europeus não é sustentável na área onde vivem.

 

Outra desvantagem deste conceito é o facto de se aceitar a hipótese de que os habitantes de um determinado compartimento da terra se encontram “isolados”, i.e., consome apenas o que nele é produzido. Na prática, os países com estilos de vida mais gastadores alavancam-se com os recursos de outros países (ex.: petróleo de países do 3º Mundo, diamantes de África, madeira da Amazónia, despejo de resíduos produzidos pela indústria europeia em países do 3º mundo, etc.).

 

Apesar de algumas falhas, a pegada ecológica é uma ferramenta que tem tido bastante sucesso, desde a sua apresentação em 1995. O conceito de pegada, além de inspirador, é simpático. Tem sido um indicador muito aceite no meio académico e ainda por organizações como as Nações Unidas, OCDE e Governos de vários países.

 

 

3.2 – Índice de Sustentabilidade Ambiental

 

 

O Índice de Sustentabilidade Ambiental (ESI – Environmental Sustainability Index) é da responsabilidade do World Economic Forum, do Yale Center for Environmental Law and Policy e do CIESIN - Center for International Earth Science Information Network. Existe para cerca de 140 países e consiste na pesagem de cerca de 20 indicadores básicos, cada um deles com 2-8 variáveis. Ou seja, o ESI no global, faz a ponderação de 68 variáveis, uma das quais é a pegada ecológica.[3.6]

 

Tab. 3.1 – Variáveis de cálculo do Índice de Sustentabilidade Ambiental.[3.6]

5 core components

20

indicators

68

variables

Environmental Systems

Air Quality

Urban SO2 concentration, Urban NO2 Concentration, Urban TSP Concentration

Water Quantity

Water Availability per capita, Water Inflow Availability per capita

Water Quality

Dissolved Oxygen Concentration, Phosphorus concentration, Suspended Solids, Electrical Conductivity

Biodiversity

Percentage of Mammals Threatened, Percentage of Breeding Birds Threatened

Terrestrial Systems

Percent of land area having very low anthropogenic impact, Percent of land area having high anthropogenic impact

Reducing Environmental Stresses

Reducing Air Pollution

NOx emissions per populated land area, SO2 emissions per populated land area, VOCs emissions per populated land area, Coal Consumption per Populated Land Area, Vehicles Per Populated Land Area

Reducing Water Stress

Fertilizer consumption per ha of arable land, Pesticide Use, Industrial Organic Pollutants per available freshwater, Percent of Country's Territory Under Severe Water Stress

Reducing Ecosystem Stress

Percentage change in forest cover 1990-95, Percentage of county with acidification exceedence

Reducing Waste & Consumption Pressures

Ecological footprint per capita, Radioactive waste

Reducing Population Growth

Total fertility rate, Percentage change in projected population between 2000 & 2050

Reducing Human Vulnerability

Basic Human Sustenance

Proportion of Undernourished in Total Population, % of population with access to improved drinking-water supply

Environmental Health

Child Death Rate from Respiratory Diseases, Death Rate from Intestinal Infectious Diseases, Under-5 Mortality Rate

Social and Institutional Capacity

Science and Technology

Mean years of schooling (age 15 and above), Technology achievement index, Innovation Index

Capacity for Debate

IUCN member organizations per million population, Civil & Political liberties, Democratic institutions, Percentage of ESI variables in publicly available data sets

Environmental Governance

Ratio of gasoline price to international average, WEF Survey Questions on Environmental Governance, Percentage of land area under protected status, Number of sectoral EIA guidelines, FSC accredited forest area as a % of total forest area, Reducing corruption, WEF subsidies survey question, WWF Subsidy measure

Private Sector Responsiveness

Number of ISO14001 certified companies per million $ GDP, Dow Jones sustainability group index, Average Innovest EcoValue rating of firms, World Business Council for Sustainable Development members, WEF Survey Questions on Private Sector Environmental Innovation,

Eco-Efficiency

Energy efficiency (total energy consumption per unit GDP), Renewable energy prod. as a % of total energy consumption

Global Stewardship

Participation in International Cooperative Efforts

# of memberships in environmental intergovernmental orgs., Percentage of CITES reporting requirements met, Levels of participation in the Vienna Convention/Montreal Protocol, Levels of participation in the Climate Change Convention, Montreal protocol multilateral fund participation, Global environmental facility participation, Compliance with International Agreements

Reducing Greenhouse Gas Emissions

Carbon lifestyle efficiency (CO2 emissions per capita), Carbon economic efficiency (CO2 emissions per dollar GDP)

Reducing Transboundary Environmental Pressures

Transborder fluxes of Sulfur Dioxide, CFC consumption (total times per capita), Total marine fish catch, Seafood consumption per capita

 

O objectivo deste índice é estabelecer meios de comparação entre diferentes países. Segundo dados de 2002, Portugal encontra-se classificado perto da média europeia e um bocado acima da média mundial:

 

Fig. 3.4 – Índice de Sustentabilidade Ambiental ESI, valores de 2002 [3.6]

 

 

3.3 – Dow Jones Sustainability Index

 

 

O Dow Jones Sustainability Index (DJSI) é dos primeiros índices de desenvolvimento sustentável pensado para empresas. Existe desde finais da década de 90. O seu objectivo é mostrar o desempenho económico de empresas líderes a nível de sustentabilidade, numa escala global.

 

O seu cálculo é feito de forma semelhante ao cálculo do habitual Dow Jones Global Index, mas os factores de peso são neste caso económicos, ambientais, e sociais. O DJSI está discriminado segundo 59 tipos de indústria, e possui até à data empresas de 14 países. [3.7]

 

Fig. 3.5 – Dow Jones Sustainability Index e Dow Jones Global Index

 

O DJSI é também uma das 68 variáveis do Índice de Sustentabilidade Ambiental, na categoria “Private Sector Responsiveness”.

 

 

3.4 – Apreciação

 

 

Os três exemplos apresentados são bastantes distintos entre si.

 

A pegada ecológica é talvez, dos três, o índice que se fundamenta numa ideia melhor estruturada (neste caso, a comparação de consumo vs recursos). Mas uma das falhas mais evidente deste indicador é a ausência, no seu cálculo, de alguma informação relevante. Os próprios investigadores que criaram esta metodologia admitem que tomaram uma opção conservadora. Segundo os próprios, contribuições como p.ex. o consumo de matérias químicas industriais (soda cáustica, benzeno, anilina, …) não serão incluídas enquanto não se chegar a uma forma unânime de traduzir o nível de recursos que o seu consumo afecta.

 

Por outro lado, a abundância de informação no 2º índice - o Índice de Sustentabilidade Ambiental (ESI) é contrastante. O ESI pode considerar-se bastante informativo. Contudo, desta junção de inúmeras variáveis, gera-se um valor cujo significado é menos imediato, mais difícil de entender.

 

Já um índice de bolsa como o Dow Jones Sustainability Index aparece num outro contexto. A sua principal virtude é que permite aliar critérios ambientais a critérios financeiros nas transações que são feitas nos mercados bolsistas. É também uma forma de valorizar o esforço que as empresas possam ter no capítulo da responsabilidade social e ambiental.

 

São três índices que, para a comunidade científica, pouco têm a oferecer tal como se apresentam. No entanto, índices deste tipo estão directamente ligados ao contexto das decisões políticas, estratégicas e empresariais, sendo provável que a sua importância cresça nas próximas décadas. Apesar de serem indicadores de selecção para governos e empresas, afectam também a comunidade científica. Mais não seja, através de repercussões que possam ter em capítulos como o nível de financiamento comunitário dado a projectos de investigação na área ambiental, o número de projectos de investigação com financiamento aprovado pelo estado, o número de colaborações entre meios científicos académicos e a indústria, o apoio à criação de novas unidades de investigação, etc.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Bibliografia

 

[3.1] Instituto do Ambiente - http://www.iambiente.pt/sids/sids.pdf

 

[3.2] Global Vision – Ecological Footprint - http://www.global-vision.org/city/footprint.html

 

[3.3] How Big Is Your Ecological Footprint? - http://www.rprogress.org/programs/sustainability/ef/

 

[3.4] Redifinig Progress - http://www.redefiningprogress.org/programs/sustainability/ef/projects/1999_results.html

 

[3.5] Relatório das Nações Unidas “State of World Population 2001 - http://www.unfpa.org/swp/2001/english/

 

[3.6] ESI - Environmental Sustainability Index - http://ciesin.columbia.edu/indicators/ESI/ESI2002_data.xls

 

[3.7] Dow Jones Sustainability Indexes - http://www.sustainability-indexes.com/

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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